Fala, pessoal! Tudo bem com vocês? Espero que estejam bem, com saúde e firmes nos estudos! Aqui é Rafael Bravo, professor e orientador do Curso Clique Juris, aonde trabalho com estudos dirigidos para concursos das carreiras jurídicas (Magistratura, Defensoria, MP, dentre outros).

Seguindo nossa série de posts sobre a prova oral do MPMG, essa semana trataremos do grupo mais temido do concurso, o GII, que envolve penal e processo penal.

Vamos à questão:

Sobre os arts. 589 e 601 do CPP.

Art. 589. Com a resposta do recorrido ou sem ela, será o recurso concluso ao juiz, que, dentro de dois dias, reformará ou sustentará o seu despacho, mandando instruir o recurso com os traslados que lhe parecerem necessários.

Art. 601. Findos os prazos para razões, os autos serão remetidos à instância superior, com as razões ou sem elas, no prazo de 5 (cinco) dias, salvo no caso do art. 603, segunda parte, em que o prazo será de trinta dias.

Esses dois artigos consentem que o recurso seja enviado à superior instância sem que as razões tenham sido apresentadas. Isso é ainda hoje possível?

Pessoal, o que o examinador queria saber é se tais artigos foram totalmente recepcionados pela Constituição de 1988, em razão dos termos “com a resposta do recorrido ou sem ela” e “com as razões ou sem elas”. Nesse sentido, há divergência doutrinária, que com certeza deve ser exposta em provas discursivas e orais, bem como a posição dos Tribunais Superiores.

Doutrina pela recepção integral dos arts. pela CRFB

Nucci: A ausência de razões não acarreta nulidade, embora jamais possa deixar o juiz de intimar e assegurar às partes o direito de apresentação das razões. A disposição legal é expressa nesse sentido. Além do que prejuízo algum, em tese, advém ao réu, uma vez que o Tribunal retomará o conhecimento pleno da questão. Ainda assim, deve o juiz buscar que o recurso seja convenientemente arrazoado pela defesa técnica constituída, especialmente quando é interposto pelo acusado diretamente. Não pode, no entanto, obrigar que o advogado o faça, se ele declina da oportunidade concedida. Porém, cuidando-se de defensor dativo, deve o juiz nomear outro, caso aquele não oferte as razões.

Quando um dos réus deseja apelar, havendo outros ainda não julgados ou que não tiverem recorrido, deve haver o desmembramento do feito, providenciando o apelante o traslado das cópias necessárias para a formação do volume que será remetido ao tribunal. Se não o fizer, importa em deserção, com a ressalva feita no § 2.º do art. 601, do CPP, isso é, no caso de réu pobre ou do Ministério Público.

Nessa linha, para a 6ª Turma STJ: “Ainda que o art. 601 do CPP autorize a remessa da apelação à instância superior quando não apresentadas as razões pelo advogado constituído, é recomendável, para conferir maior efetividade à ampla defesa, a prévia intimação do réu para indicar novo causídico e, na sua falta, nomear defensor para arrazoar o recurso. Eventual descumprimento de tal formalidade deve ser apontado em tempo razoável, sob pena de a inércia da parte esvaziar a alegação de prejuízo para o réu. Interposta a apelação, a defesa técnica, devidamente intimada, deixou de arrazoar o recurso, julgado pelo Tribunal de Justiça. Após o decurso de quase cinco anos do trânsito em julgado, o habeas corpus é utilizado para apontar o vício e requerer a nulidade do julgamento, o que enfraquece, nos limites dos precedentes da Corte, a alegada nulidade. Apesar do direito à plenitude da defesa, o decurso do tempo evidencia a ausência de prejuízo concreto para o réu, imprescindível para a declaração de nulidade do ato, principalmente quando o apelo devolveu toda a matéria ao Tribunal, o qual reexaminou a sentença penal de forma ampla. Ademais, a impetração não apontou nenhuma tese que deixou de ser enfrentada no julgamento, a justificar a anulação do acórdão. Habeas corpus não conhecido” (HC 302.586 – RN, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz, 10.05.2016, v.u.).

Doutrina pela não recepção pela CRFB: violação de princípios constitucionais

De acordo com o doutrinador Gustavo Badaró, a admissão pelo juízo “ad quem” dos recursos sem as razões e contrarrazões fere o princípio da dialeticidade.

Por princípio da dialeticidade deve se entender que o recurso deve ser discursivo, argumentativo, dialético. Não basta que a parte prejudicada manifeste o desejo de atacar a decisão. Além da manifestação de vontade de impugnar o ato, o recorrente deverá expor as razões pelas quais recorre e a parte contrária terá o direito de apresentar contrarrazões. Razões e contrarrazões são indispensáveis.

É o que Frederico Marques qualifica como pressuposto recursal da “motivação”: o recorrente precisa motivar o pedido de novo exame da questão decidida, não podendo recorrer sem motivar a impugnação, posto que “recurso interposto sem motivação equivale a pedido inepto”. Todavia, uma visão efetiva da garantia constitucional do contraditório está a indicar a não recepção do art. 589, caput, e do art. 601, caput, do CPP, por ferirem o princípio da dialeticidade que, nada mais é do que uma projeção do princípio do contraditório em segundo grau de jurisdição. Sem razões e contrarrazões restará impedindo o efetivo exercício do contraditório na fase recursal.

O Tribunal não terá como saber os fundamentos da impugnação (no caso das razões) ou os contra-argumentos que corroboram a sentença. Sem poder cotejar as razões do recurso, com os fundamentos da decisão impugnada, será inviável para o órgão ad quem avaliar o acerto do ato, ou seu erro, seja ele in procedendo, seja in judicando.

Assim, mesmo que o defensor não queira recorrer deverá apresentar as razões do recurso e, caso se negue ou não as apresente quanto intimado, o juiz deverá nomear outro defensor para que o faça, comunicando o órgão de classe para apurar o ocorrido, se for o caso. Isso porque, não obstante o Código de Processo Penal, especificamente no art. 601, caput, admitir que o recurso suba para o Tribunal sem as razões, o julgamento da apelação sem as devidas razões não tem mais sido admitido pela doutrina e jurisprudência, pois feriria o contraditório, a ampla defesa, bem como a paridade de armas, de forma que atualmente a apresentação das razões do recurso é imprescindível.

Para Aury Lopes, todo e qualquer recurso deve ser fundamentado, expondo as questões de fato e/ou de direito que o sustentam. Mesmo a apelação, em que o art. 601 admite a subida com as razões ou sem elas, tem sido objeto de uma releitura constitucional, de modo que, em nome da ampla defesa e do contraditório, os tribunais têm determinado o retorno dos autos à comarca de origem para que sejam apresentadas as razões, inclusive com a nomeação de defensor dativo para apresentá‐las se não o fizer o constituído. Além da ampla defesa, a ausência de razões também viola o contraditório, porque sem elas não tem a outra parte condições plenas de contra‐arrazoar. Por isso, os tribunais ultimamente têm determinado que os autos baixem em diligências para que o defensor ofereça as razões ou seja nomeado um dativo para isso.

O Ministério Público pode interpor o recurso e não apresentar as razões? Para essa corrente doutrinária, evidente que não, pois violaria ao mesmo tempo, a regra recursal da motivação dos recursos e também o contraditório e o direito de defesa, pois como contra‐arrazoar um recurso sem razões?! Diante de tal situação, a primeira opção é o tribunal ad quem, recebendo o apelo sem as razões do acusador, devolver os autos à comarca de origem para que seja pessoalmente intimado o representante do parquet para apresentar suas razões. Após isso, em respeito à ampla defesa e ao contraditório, deverá à defesa ser novamente oportunizada a apresentação de contrarrazões, mesmo que já o tenha feito, pois somente agora poderá efetivamente rebater as razões do recurso.

Ademais, não estaria demonstrado o interesse recursal, na medida em que inexiste fundamentação hábil a evidenciar o gravame. Assim, caso o MP insista na não apresentação das razões, a solução seria o não conhecimento do recurso da acusação despido de fundamentação, sendo que o parecer o Parquet em segundo grau não supre a referida inércia.

Nessa quadra, há crítica ao da doutrina que afirma haver “desistência” por parte do promotor/procurador que não apresentasse as razões recursais, por violar os princípios da obrigatoriedade e indisponibilidade, inerentes à ação penal de iniciativa pública, consubstanciados no art. 576 do CPP.

Jurisprudência dos Tribunais Superiores

O STF em dois momentos distintos teve entendimentos em ambos os sentidos, conforme demonstrado abaixo:

1º) A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que a ausência de razões de apelação e de contrarrazões à apelação do Ministério Público não é causa de nulidade por cerceamento de defesa, se o defensor constituído pelo réu foi devidamente intimado para apresentá-las. (Supremo Tribunal Federal, 1ª Turma, Habeas Corpus nº 91.251/RJ, rel. Min. Cármen Lúcia, decisão por maioria, julgado em 19/06/2007, DJ de 17/08/2007)

2º) A ausência de apresentação de razões pela defesa, vindo a ser julgado o recurso, implica deixar o acusado sem a proteção técnica a que visa o artigo 261 do Código de Processo Penal. (Supremo Tribunal Federal, 1ª Turma, Habeas Corpus nº 88.409/SP, rel. Min. Marco Aurélio, decisão unânime, julgado em 12/05/2009, DJ de 26/06/2009)

Quanto ao STJ, não há julgados específicos sobre o tema. Os existentes mencionam tão somente o texto dos referidos artigos, sem entrar no mérito da questão.

Assim, pessoal, uma resposta que satisfaça o examinador envolve a demonstração de conhecimento das duas posições doutrinárias, com os respectivos fundamentos, bem como com a indicação de que o tema não está pacificado nos Tribunais Superiores.

Gostaram da dica, pessoal? Espero que sim!

Sempre buscamos dar esse tipo de dicas aos alunos do Curso Clique Juris em nossos cursos e estudos dirigidos, para potencializar ainda mais sua preparação para as provas de concurso mais difíceis do país. Caso você se interesse, entre em contato conosco!

Desejo a todos sucesso e bons estudos!

Rafael Bravo

Instagram com dicas: @rafaelbravog e @cursocliquejuris

e-mail: rafaelbravo.coaching@gmail.com

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Defensor Público Federal, bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, mestre em Direito Constitucional e Teoria Geral do Estado pela PUC-Rio, membro suplente da Banca de Direito Penal, Processo Penal e Penal Militar do 5º Concurso Público para ingresso na carreira de Defensor Público Federal - DPU/2015. Foi aprovado aos 24 anos, com apenas um ano de estudos no concurso da DPU em 2010.

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