14 de julho de 2020 | Rafael Bravo | Deixe um comentário DIREITO PROCESSUAL COLETIVO: LITÍGIOS E DECISÕES ESTRUTURAIS Oi pessoal! Como estão? Firmes e fortes nos estudos? Aqui é Rafael Bravo, professor e orientador do Curso Clique Juris, aonde trabalho com estudos dirigidos para concursos das carreiras jurídicas (Magistratura, Defensoria, MP, dentre outros). Minha dica de hoje é sobre um tema relativamente novo no direito processual coletivo e que vem ganhando bastante relevância em provas de concurso: litígios estruturais. Ele já foi cobrado em algumas provas objetivas, bem como em provas discursivas do MPGO e MPMG. Por isso, fiquem ligados no assunto! Vamos entender do que se trata. Primeiramente, vamos conceituar processo coletivo: para Fredie Didier, processo coletivo é aquele em que se postula um direito coletivo lato sensu (situação jurídica coletiva ativa) ou se afirma a existência de uma situação jurídica coletiva passiva (deveres individuais homogêneos) de titularidade de grupo de pessoas. Ou seja, o núcleo do conceito de processo coletivo está em seu objeto litigioso e na tutela do grupo: coletivo é o processo litigioso que tem por objeto uma situação jurídica coletiva de titularidade de um grupo de pessoas. Nesse sentido, alguns processos coletivos acabam sendo processos estruturais, porque neles são produzidas decisões estruturais. Segundo Edilson Vitorelli, há uma categoria de ações de interesse público que se valem de ordens judiciais que impõem obrigações de fazer ou não fazer para a realização de direitos fundamentais. Nessa linha, nas hipóteses em que para atingir o objetivo de tutela de um direito fundamental há necessidade reformar instituições inteiras, as ordens judiciais respectivas são chamadas de structural injunctions (decisões estruturais). O conceito de decisão estruturante é o desenvolvido pela doutrina estadounidense na década de 1960. O termo “processo coletivo estrutural” é aplicável aos casos em que a pretensão coletiva não é apenas de imposição de um comportamento, mas a realização de uma alteração estrutural em uma organização pública, entidade ou em uma política pública, com o objetivo de potencializar o comportamento desejado no futuro. MEMORIZE: São estruturantes as decisões judiciais nas quais, a partir de um litígio que transcende o interesse individual e privado e, portanto, é de interesse público, se busca a reestruturação de determinada organização social ou política pública, com o objetivo de concretizar direitos fundamentais ou interesses socialmente relevantes. Assim, as medidas estruturantes constituem um instituto de origem norte-americana, que surgiu de necessidades práticas experimentadas no controle judicial de políticas públicas e nos litígios de interesse público (public law litigation). O caso paradigmático de litígio estrutural nos EUA decorre do precedente Brown v. Board of Education. Em 1954 a Suprema Corte norte-americana entendeu que era inconstitucional a admissão de estudantes em escolas públicas com base em um sistema de segregação racial. Ao determinar a inclusão de negros numa escola pública até então destinada à educação de pessoas brancas, a Suprema Corte deu início a um processo amplo de mudança do sistema pública de educação naquele país, fazendo surgir o que se chamou de structural reform. O modelo de decisão proferida expandiu-se e foi adotado em outros casos, de modo que o Poder Judiciário dos EUA, por meio de suas decisões, passou a impor amplas reformas estruturais em determinadas instituições burocráticas, com o objetivo de ver atendidas determinadas diretrizes constitucionais. Exemplos: ações com o objetivo de mudar o funcionamento de instituições estatais complexas, como o sistema de saúde, o funcionamento de escolas e creches ou o sistema prisional, bem como relacionadas a grandes desastres ambientais (como o caso Mariana/MG). Principais características dos litígios estruturais: 1. Trata-se de um conflito de elevada complexidade, que envolve múltiplos polos de interesse, os quais se apresentam em oposições e alianças parciais. 2. O litígio estrutural implica a implementação, pela via jurisdicional, de valores públicos reputados juridicamente relevantes, mas que não foram bem sucedidos espontaneamente na sociedade. 3. O litígio estrutural se diferencia pela necessidade de reforma de uma instituição, pública ou privada, para permitir a promoção do valor público visado. Essa instituição pode ser a protagonista da violação do direito material litigioso ou pode obstaculizar a sua promoção. Nesse sentido, a decisão estrutural possui conteúdo complexo, prescrevendo uma norma jurídica de conteúdo aberto, elencando um objetivo a ser alcançado. Contudo, percebeu-se que a emissão de ordens ao administrador estabelecendo objetivos genéricos não era suficiente para alcançar os resultados desejados. Assim, se notou que ou o Poder Judiciário se envolvia no cotidiano da instituição, cuidado dos meios para obtenção dos fins a serem alcançados (conforme determinado pelas decisões judiciais), ou teria que se conformar com a ineficácia de sua decisão. Ademais, outra característica marcante é que à decisão principal seguem-se inúmeras outras que têm por objetivo resolver problemas decorrentes da efetivação das decisões anteriores de modo a permitir a efetiva concretização do resultado almejado na principal. É o que Sérgio Arenhart chama de provimentos em cascata. A complexidade da matéria envolvida na implementação e aplicação de políticas públicas força a migração de um modelo meramente responsivo e repressivo do Poder Judiciário (modelo de atuação posterior aos fatos já ocorridos para aplicação da norma jurídica) para um modelo resolutivo e participativo, que pode anteceder aos fatos lesivos e resultar na construção conjunta de soluções jurídicas adequadas. A efetivação de tais decisões deve se dar de forma dialética, a partir de um debate amplo cuja única premissa consiste em tomar a lide como fruto de uma estrutural social a ser reformada. A base normativa da execução das decisões estruturais decorre dos arts. 139, IV e 536, §1º, do CPC. Ademais, o art. 493 do CPC também é uma ferramenta indispensável para a concretização das decisões estruturais, eis que impõe ao Juiz o dever de ajustar a decisão à realidade atual dos fatos. Ademais, essa mudança está amplamente amparada pela ótica do Processo Civil do Estado Democrático Constitucional adotada pelo CPC, a exemplo dos princípios da solução consensual, da primazia do julgamento do mérito, da boa-fé processual objetiva e da cooperação (arts. 32, 42, 52 e 62 do CPC), mas é ainda mais necessária para solução dos problemas surgidos em razão da sindicabilidade judicial de políticas públicas por meio de ações coletivas. Nesse sentido, nos processos coletivos estruturais, comumente o juiz abre mão da centralidade do processo, reconhecendo a complexidade do problema, trazendo para o processo ampla participação de todos os envolvidos, inclusive a sociedade civil, para delimitação de um programa de resolução do conflito. Assim, são tomadas decisões mais flexíveis e provisórias, com inclusão dos envolvidos na supervisão das medidas adotadas, com a possibilidade de contínuas revisões para adequação dessas medidas aos problemas surgidos ao longo de sua implementação, iniciando-se por decisões estruturantes (organizativas) que estabeleçam metas, objetivos e parâmetros de controle do cumprimento e da efetividade das medidas judiciais adotadas. As medidas estruturantes permitem a um só tempo o conhecimento colaborativo do problema pelas partes e pelo juiz (colaborative learrning) e uma maior responsabilização e legitimação democrática (democratic accountability), visando a efetividade da decisão judicial. Por fim, não se pode negar a existência de dificuldades empíricas do processo estrutural, de maneira que há críticas em relação ao modelo. Nessa linha, do ponto de vista prático, a principal crítica em relação ao processo coletivo estrutural é que ele violaria a teoria da separação de poderes e atribui aos juízes competências que são executivas, as quais eles têm pouca aptidão para desempenhar. Os defensores do modelo, contudo, respondem a essa crítica argumentando que não se trata de uma violação, mas sim de uma releitura da teoria da separação dos poderes. Além disso, a partir de sua legitimidade contramajoritária, o Poder Judiciário é competente para, caso haja omissão dos outros poderes, determinar a concretização de direitos fundamentais constitucionalmente garantidos. Pessoal, a dica de hoje é muito importante para quem presta MP e Defensorias, pois é um tema “da moda” e de grande importância prática na atuação do dia a dia dessas carreiras. Sempre buscamos dar esse tipo de dicas aos alunos do Curso Clique Juris em nossos cursos e estudos dirigidos, para potencializar ainda mais sua preparação para as provas de concurso mais difíceis do país. Caso você se interesse, entre em contato conosco! Desejo a todos sucesso e bons estudos! Rafael Bravo Instagram com dicas: @rafaelbravog e @cursocliquejuris e-mail: rafaelbravo.coaching@gmail.com CompartilheThe following two tabs change content below.BioLatest Posts Rafael Bravo Defensor Público Federal, bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, mestre em Direito Constitucional e Teoria Geral do Estado pela PUC-Rio, membro suplente da Banca de Direito Penal, Processo Penal e Penal Militar do 5º Concurso Público para ingresso na carreira de Defensor Público Federal - DPU/2015. Foi aprovado aos 24 anos, com apenas um ano de estudos no concurso da DPU em 2010. 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